Arquivo de morte

declaração de intenções para quem me tocar à porta hoje ou me chatear II

Posted in só na minha cabeça with tags , , on Novembro 1, 2010 by João Carvalho

Nesta casa há pão mas continua a não haver deus.

hoje terias 45 anos, “olhos sem cor”

Posted in só na minha cabeça with tags , , , , , , , , , , , , on Outubro 22, 2010 by João Carvalho

caiu uma noite de cimento
por cima dos teus olhos
e o tempo está quieto
faz horas que ali está
uma árvore talvez pudesse
arrancar uma lua dessa noite
e deixar-te a correr com o tempo
devagar
caiu uma noite sobre a tua árvore
e o tempo está quieto
o tempo está quieto
e tu passas  e abres ramos
tu passas  e abres olhos
devagar  sem cor

(2006)

o ser mais estranho

Posted in só na minha cabeça with tags , , , , on Fevereiro 25, 2010 by João Carvalho

Um homem sonha com uma mulher. Um sonho que agora não consegue recordar. Agora mesmo ia escrever qualquer coisa de que se esqueceu. Acontece que entre o pensar e o escrever o ser mais estranho lhe entrou pela casa dentro, como a noite.
Esse homem pensa que devia ter ficado ao seu lado aquela noite. Podia ter adormecido com a cabeça sobre o seu colo ou simplesmente sobre as suas mãos apoiadas na beira da cama. Mandaram-no embora.
Um homem descobre que pode dormir de joelhos levantados como as grávidas. Tem o hábito de dormir de lado com as pernas flectidas o que lhe aprofunda a dor no joelho das dores, o esquerdo, o que leva com todos os objectos pontiagudos com que se cruza, o mesmo que o avisa que o tempo vai mudar. A mulher costumava dizer, esse teu joelho
Um homem pensa que esta posição das grávidas só deve mesmo interessar aos obstetras, evita que se baixem.
Um homem abandona uma mulher para morrer sózinha numa cama e, muito mais tarde, percebe que ela continua sem morrer amarrada a ele, numa noite em que o ser mais estranho lhe entrou pela casa dentro, como a noite.
Um homem transporta um saco branco. Um saco branco com objectos amontoados. Um homem transporta um saco que recebeu das mãos de alguém responsável pelas coisas finais. Deve ser terrível ser responsável pelas coisas finais. Talvez não haja ninguém responsável pelas coisas finais. Um homem sabe, porque pensou nisto muito mais tarde, que a urgência de ocupar de novo o espaço livre para alguém às portas da morte não se compadece com sentimentalismos de outra ordem, como procurar não amontoar objectos num saco branco. Um homem pensa que às portas da morte é uma expressão sem sentido. Um homem caminha com um saco branco, lá dentro um desenho, um balão mágico voador com destino a um mundo divertido. Um homem caminha de regresso a casa transportando um saco branco cheio de objectos amontoados, uma almofada e um desenho. O homem guarda o desenho e a almofada. A almofada onde uma mulher reposou a cabeça para morrer. Com o tempo o homem deixou de conseguir reconhecer a almofada no meio das restantes. O homem só pensará nisto muito mais tarde, numa noite em que terá febre e não conseguirá adormecer, e então, depois de muito tempo e vencido, sonhará um sonho em que o ser mais estranho lhe entra pela casa dentro, como a noite.
Uma mulher sem tempo, olha pelo última vez o seu filho ser levado para casa. Um homem sabe isto porque vê os olhos encharcados da mulher, e por um momento, hesitante, quer voltar para trás com o seu filho pela mão, para ficar um pouco mais junto à sua mãe. Um homem não sabia que seria a última vez e por isso leva o seu filho e hoje o ser mais estranho entra-lhe pela casa dentro, como a noite.
Um homem pensa nisto muito tempo depois quando o ser mais estranho lhe entrou em casa, como a noite.
Um homem sabe que lhe vão telefonar e por isso prepara-se, acorda cedo e faz a barba. Depois, o ser mais estranho entra-lhe pela casa dentro, como a noite.
Um homem não hesita como no dia em que teve de levar o seu filho para casa, e escolhe o caixão mais simples que lhe apresentam para o funeral onde a mulher mais simples será levada. Depois, um homem regressa a casa onde o seu filho o aguarda. Um homem tem finalmente a conversa que durante muito tempo pensou ter.
Filho, a mãe morreu. E depois, o ser mais entra-lhe pela casa dentro, como a noite.
Um homem guarda objectos especiais em sítios especiais. Outros existem pela casa porque já não pertencem a este tempo e são deixados em paz.
Um homem tem molduras vazias para pendurar em paredes vazias. De cada vez que escolhe uma fotografia o ser mais estranho entra-lhe pela casa dentro, como a noite.
Um homem abraça o seu filho e beija-o, e este beija o seu pai.
Feliz ano novo, filho. Feliz ano novo, pai.
As paredes continuam vazias e o ser mais estranho continua a entrar-lhe pela casa dentro, como a noite.

(Janeiro, 2010)

otite

Posted in só na minha cabeça with tags , , , , on Dezembro 3, 2009 by João Carvalho

Isso é coisa de criança. Acha? E fica-se surdo, não se morre, da gripe sim morre-se, e de atravessar a estrada distraído também. Fica-se surdo sim, é o que vem na net. Aliás, todas as maleitas deste mundo vêm na net, depuradas de todas as impurezas do significado ficam os significantes, os suficientes e os acessórios para nos transportar para uma morte, pelo menos psíquica, em breve mas não necessáriamente rápida. Procuramos ávidos a cura e dão-nos a experiência do mal, aquilo que já temos, a purulência liquída afinal.

Depois, desliga-se o ser digital, afinal estamos na província, e pede-se um médico ao domicílio, que 10€ não é nada e já é tarde e noite e faz chuva e vento e estamos na província e nem pensar fazer 15km para ir apanhar doenças ao centro de saúde (que ainda nos mandam ao hospital a Torres), é deixá-las lá com todos os seus significados e respectivos sintomas significantes. Entre sofrer e ser maluco mais vale uma morte significativa, uma otite.

O médico, não o velhinho Ataíde de outra provincía que esticava a conversa entre auscultações rigorosas e o tempo do termómetro dar a febre – nesse tempo fazia sentido a expressão “médico de família” – fez valer o seu euro por minuto e além de fumador inveterado, é adepto dos antibióticos, mais vale dar 2 ou 3 tiros do que 5 ou 6, palavras dele, e eu obedeci e encharco-me a ver o que vai dar.
Posso morrer? a net talvez até diz que sim, ficar surdo, eu sei lá, mas não ouvir, até pode ser uma benção para um ateu. (Coisas bárbaras que escrevo.)

Posted in só na minha cabeça with tags , , , , , , , on Agosto 25, 2009 by João Carvalho

Posted in só na minha cabeça with tags , , , on Maio 6, 2009 by João Carvalho

Um dia não tenho mais noites para te dar. Um dia assim como este atiro-me daqui. Um dia assim fico aqui e parado deixo passar os comboios até ao último da noite. Um dia assim adormeço naquela curva apertada onde os pneus chiam no asfalto. Um dia o muro move-se para dentro da estrada. Um dia desvio-me a tempo de agarrar um coelho pelas orelhas.

Israel e a memória

Posted in só na minha cabeça with tags , , , on Dezembro 28, 2008 by João Carvalho

Waltz with Bashir

Estreia na próxima semana.

ataque(s) perverso(s)

Posted in só na minha cabeça with tags , , on Dezembro 28, 2008 by João Carvalho

“Um governo não deve mobilizar um exército motivado pela raiva, os líderes militares não devem provocar a guerra movidos pela cólera. Antes, deves agir se for benéfico; caso contrário, deves desistir. A raiva pode se transformar em alegria, a cólera pode se tornar prazer, mas uma nação destruída não pode ser restaurada para a existência, e os mortos não podem ser devolvidos à vida.” A Arte da Guerra, Sun Tzu séc. IV a.c.

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Mideast Israel Palestinians Gaza

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imagens aqui

Este ataque desproporcional de Israel aos ataques com rockets do Hamas parece ter como objectivo criar um novo status quo mais favorável a Israel antes da entrada da nova administração americana de Obama; através do enfraquecimento das forças do Hamas e/ou conquista de mais território por via de uma invasão terrestre da faixa de Gaza. São os falcões da guerra a mostrar os dentes perante a promessa de alçançar a paz.
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